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Rio de Janeiro, RJ, Brazil
Hematologista Clínico com paixão por Propedêutica e pela Filosofia - Consultório: * Tel. 21 38160545 / 21 988389220

domingo, 29 de janeiro de 2012

A Sina Do Lobisomem


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O LOBISOMEM

Pobre coitado, dividido em metades... Homem... Lobo...
Homem que se transforma em lobo... Homem que se transforma...
Segundo a crendice popular ele vagueia pela noite para cumprir o seu destino...
Homem comum, vive e trabalha... conversa, convive, comemora...
Nas noites de Lua Cheia se transforma em um lobo ou em um homem peludo com cabeça de lobo e ataca quem cruza o seu caminho. Antes do dia raiar volta a forma humana.
Justo uma Lua Cheia é o evento transformador... Curioso pois também fui testemunha da maior lua do século em Itatiaia... e de fato fui transformado, não em Lobisomem, mas em Vampiro - meu alter ego... transformando minha metade humana dependente do sangue de outrem...

"O lobisomem é o filho que nasceu depois de uma série de 7 filhas. Aos 13 anos, numa terça ou quinta-feira, sai de noite, e topando com um lugar onde um jumento se deitou, começa a sua sina. Daí por diante, todas as terças e sextas-feiras, de meia-noite às duas horas, o lobisomem tem de fazer a sua corrida ... Quem ferir o lobisomem, quebra-lhe o destino; mas que se não suje no sangue ou herdará a triste sorte... Para desencantá-lo basta o menor ferimento que cause sangue. Ou bala que se unte com cera de vela que ardeu em 3 missas de domingo ou na missa do galo, na meia-noite do Natal." (Luís da Câmara Cascudo)


Vida árdua... dividida em metades... tendo que ser ferido a sangue para ser normal...
Ferido a sangue para ser inteiro...
Ferido a sangue para que metades façam sentido... porque não sei quando as metades tem que fazer algum sentido...
Porque nunca sei qual metade do sangue coagula e qual metade sangra...



Que a força do medo que tenho

Não me impeça de ver o que anseio



Que a morte de tudo em que acredito

Não me tape os ouvidos e a boca
Porque metade de mim é o que eu grito 
Mas a outra metade é silêncio. 



Que a música que ouço ao longe

Seja linda ainda que tristeza
Que a mulher que eu amo seja pra sempre amada 
Mesmo que distante 
Porque metade de mim é partida 
Mas a outra metade é saudade. 



Que as palavras que eu falo

Não sejam ouvidas como prece e nem repetidas com fervor
Apenas respeitadas 
Como a única coisa que resta a um homem inundado de sentimentos 
Porque metade de mim é o que ouço 
Mas a outra metade é o que calo. 



Que essa minha vontade de ir embora

Se transforme na calma e na paz que eu mereço
Que essa tensão que me corrói por dentro 
Seja um dia recompensada 
Porque metade de mim é o que eu penso mas a outra metade é um vulcão. 



Que o medo da solidão se afaste, e que o convívio comigo mesmo se torne ao menos suportável.

Que o espelho reflita em meu rosto um doce sorriso
Que eu me lembro ter dado na infância
Por que metade de mim é a lembrança do que fui 
A outra metade eu não sei. 



Que não seja preciso mais do que uma simples alegria

Pra me fazer aquietar o espírito
E que o teu silêncio me fale cada vez mais 
Porque metade de mim é abrigo 
Mas a outra metade é cansaço. 



Que a arte nos aponte uma resposta

Mesmo que ela não saiba
E que ninguém a tente complicar 
Porque é preciso simplicidade pra fazê-la florescer 
Porque metade de mim é platéia 
E a outra metade é canção. 



E que a minha loucura seja perdoada

Porque metade de mim é amor
E a outra metade também. 





(Oswaldo Montenegro)
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quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

A Face

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Por Mozart Noronha

A face que é da vida a expressão
Faz-se da alma o espelho reluzente;
Refletindo no olhar o ser da gente,
Transparece o que sai do coração.

Na face, Deus, com toda precisão
Do divinal artista e Pai clemente,
Colocou carnes, músculos...e, contente
Foi contemplando toda a criação.

Com pele Deus forrou devagarinho
Ouvidos, ossos, nervos...e, com carinho
Resolveu navegar em cada artéria,

Do nariz transportando fôlego e vida.
Finalmente, na boca pôs comida
Sintetizando o espírito e a matéria.
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segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

Sangue Emocional



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Qual é mais digna ação da alma; sofrer os dardos penetrantes da sorte injusta, ou opor-se a esta corrente de calamidades e dar-lhes fim com atrevida resistência?
(Shakespeare - Hamlet) 
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Algumas pessoas acreditam ser obrigatório um motivo de vida (existencial) para aparecer a Depressão...

-Estão erradas!!!

Quando não encontram um motivo "justo" para sua Depressão, acabam achando impossível manifestar um sentimento depressivo. Pensam que estar deprimido sem motivo aparente (apesar das "coisas" estarem bem) seria considerado fraqueza... 

Por uma questão biológica e natural, nem sempre as emoções obedecem a razão e, apesar de sabermos racionalmente não haver motivos suficientes para nossa Depressão, esta alteração afetiva acaba aparecendo mascaradamente... Quase sempre um sinal de alerta para uma eminente falência psíquica (ou esgotamento).

Há pessoas que não toleram presenciar cenas de sangue sob o risco de passarem mal... (particularmente adoro ver sangue, me sinto vivo e avivado... é o sangue a verdadeira fonte de toda a existência...) 

Ha alguns anos que sou chefe clínico de plantão de uma Unidade de Atendimento de Emergência Pública do Rio de Janeiro. Por inúmeras vezes testemunhei desmaios provocados pela simples observação de uma ferida aberta ou a exposição de sangue... Pois bem, o desmaio é uma defesa psíquica do organismo que não deseja presenciar a cena, portanto, uma atitude francamente psicológica. 
Essa fuga de uma realidade não é uma atitude planejada pelo nosso psiquismo (inconscientemente). 

Ora, ninguém acredita que esses desmaios sejam doença física que aparece sempre que o paciente estiver diante de sangue. Portanto, tratam-se de desmaios eminentemente "psíquico".

Nem podemos pensar que a pessoa desmaiou porque assim desejou, ou que está fingindo um desmaio. Não é um "PITI"... Trata-se de uma atitude psíquica de adaptação à uma situação que não se quer encarar...  O medo do sangue - aquele que representa vida... 
É a emoção subjugando a razão.
Portanto, a conclusão simples e imediata é que as emoções aparecem independente de nossa vontade, sendo assim, as alterações do humor aparecem mesmo diante de nosso suposto controle... basta que o "sangue" esteja presente, basta que o "sangue" represente algo que não se quer...

Limpar as feridas ou banhar-se de sangue?


De Shakespeare trago, mais uma vez, as palavras que espero sejam conclusivas:
Acima de tudo sê fiel a ti mesmo, 
Disso se segue, como a noite ao dia, 
Que não podes ser falso com ninguém 

(acrescento) nem mesmo com teu sangue...






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Sopa Com Medicina

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O Sopa Com Medicina Está Voltando !!!

René Descartes,
Disse que a unidade de tudo estava na razão separada da matéria...
Comparava o corpo humano a uma máquina, e o doente era como um
relógio defeituoso... O homem passou a ser dois, corpo e alma, o que
era interessante tanto para a Igreja, como para Ciência. Também
trouxe a concepção do conhecimento das partes, para entender o "todo".

Pois bem Senhores,
Parece que evoluímos muito, a partir dessa visão cartesiana da
medicina...
Foucault soube detalhar isso de forma primorosa... apresentando um
lindo colorido, trocando o "império do olhar" pela "arte de ver"...

Um filósofo médico vai trazer a mesa esta
evolução... realmente valerá a pena esse encontro...

Até lá,

Assuero Silva




(Como Sempre no Garcia e Rodrigues - Leblon - numa noite de quarta feira... )


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domingo, 22 de janeiro de 2012

Desvendando O Artigo Científico


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Senhores,
Limitado em movimentos, fazendo revisões em dissertações e teses... tendo que ler uma infinidade de referências...
Descobri um valioso guia para noites insones decifrando artigos científicos.
É sabido que muitos autores tentam esconder alguma realidade...
Mas... Este guia desvenda tudo!

Boa Leitura 



Texto original
O que significa na verdade
- Como a muito tempo se sabe.- Não tive vontade de procurar a referência.
- Isto é conhecido- Eu acho que é assim.
- Geralmente se afirma isso.- Eu e meus colegas pensamos assim.
- Há algumas discussões em torno do assunto.- Ninguém acredita em mim.
- Isto pode ser demostrado.- Acredite em mim.
- De grande importância teórica.- Eu acho isso interessante.
- De grande importância prática.- Isto justifica o meu emprego.
- De grande importância histórica.- Isto pode me tornar famoso.
- O resultados típicos mostram.- Escolhemos os melhores resultados.
- Correto em uma certa ordem de grandeza.- Errado.
- Valores obtidos de forma empírica.- Valores obtidos acidentalmente.
- Os resultados não são conclusivos.- Os resultados poderiam destruir minha hipótese.
- Trabalho adicional é necessário.- Preciso de mais dinheiro para o projeto.
- Sintetizado de acordo com os protocolos padrões.- Comprado da Merck.
- Obrigado Dr. Silva pela assistência na parte técnica e obrigado Prof. Maria Soares pelas valiosas discussões.- Obrigado Dr. Silva por ter feito todo o trabalho e obrigado Prof. Maria Soares por ter me explicado o que tudo significa.
- Por enquanto não é possível se obter respostas precisas para este problema.- Mesmo não tendo a resposta eu achei que poderia publicar um artigo com essas besteiras.
- Embora alguns detalhes desta imagem foram perdidos na cópia, o original apresenta bem esses detalhes.- Impossível de se visualisar os detalhes mesmo no original.
- Presumidamente isso acontece em intervalos mais longos de tempo.- Não tive paciência para realizar um experimento mais demorado
- A concordância com a curva esperada é :
  1.excelente
  2.bom
  3.satisfatório
  4.regular
  5.como esperado
- A concordância com a curva esperada é :
  1.regular
  2.fraco
  3.duvidoso
  4.péssimo
  5.inexistente
- Geralmente se diz que...- Somente alguns pesquisadores pensam assim.
- Trabalho adicional é requerido para elucidar o trabalho.- Eu não entendi os resultados.
- Lamentavelmente uma teoria com abordagem quantitativa não foi ainda formulada.- Todo mundo já percebeu que isso não faz sentido.
- Eu espero que este trabalho estimule outras pessoas a investir neste campo de conhecimento.- Não me abandonem!!
- Composto de alta pureza.- Isto é o que afirmava o rótulo.
- Os resultados estarão em uma próxima publicação.- Não vou mais me arriscar nessa linha de pesquisa, estou fora!
- Algumas amostras foram escolhidas para o estudo- As outras não faziam sentido.


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quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

Papiro Médico

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Em 1500 anos antes de Cristo, este papiro foi escrito (ele mesmo uma cópia de um documento com mais de mil anos)...
Trata-se do relato de 48 casos médicos, com detalhes minuciosos para a abordágem ao paciente com trauma de crânio...

"...ao examinar um homem com uma ferida aberta na cabeça que chegue até o osso, rompendo o crânio e expondo os miolos, deve-se palpar a abertura. Como as ondulações surgidas no cobre fundido num cadinho, algo la dentro palpita e estremece ao toque dos dedos como a moleira ainda aberta de um bebê..."




-Provavelmente a primeira descrição (documental) do cérebro humano.
Os egípcios já sabiam que o órgão era coberto por membranas - meninges - e que participava da organização dos movimentos e da sensibilidade, porem, tinham como certo que a fonte do pensamento e de toda a consciência era o coração...

Acho que eles, os antigos, é quem tinham a razão...
Tanto racionalismo, para no final, sermos apenas seres emocionais... onde quem manda mesmo é o coração!!!




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terça-feira, 17 de janeiro de 2012

Aula do Congresso de Emergência - Gramado RS

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Congresso de Gramado.

Vale ver.

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Medicina Transfusional

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A atual medicina não permite mais que condutas terapêuticas sejam tomadas sem evidências que as justifiquem. É com esse foco que pretendemos modificar a gestão do sangue no Hospital Federal do Andarai.
Por iniciativa do Serviço de Sangue, um grupo multidisciplinar, esta elaborando uma série de padronizações referentes a condutas transfusionais. O objetivo inicial é reduzir o número absoluto e relativo de transfusões ( estimamos que em 30% dos casos, é possível que tenha ocorrido uma indicação fora de conformidades técnicas ).
A finalidade é orientar "boas práticas transfusionais" a todos os médicos do hospital. Visando fornecer aos colegas as últimas evidências na literatura mundial para auxiliar na escolha do componente hemoterápico mais adequado, assim como nos procedimentos terapêuticos distintos (aféreses, transfusões autólogas, etc.) ou nas condutas frente a reações transfusionais adversas.
As referências que estão sendo adotadas, foram cuidadosamente escolhidas, de sorte a fornecer evidências sólidas sobre estratégias transfusionais em pacientes clínicos, cirúrgicos, oncológicos ou em estado crítico...

... Em Breve.


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( a introdução e 4 capítulos estão prontos)

domingo, 15 de janeiro de 2012

Céu De Ícaro e De Galileu

...O céu de Ícaro tem mais poesia que o de Galileu
E lendo teus bilhetes, eu lembro do que fiz
Querendo ver o mais distante e sem saber voar
Desprezando as asas que você me deu


Tendo a lua aquela gravidade aonde o homem flutua
Merecia a visita não de militares,
Mas de bailarinos
E de você e eu...
(Paralamas - Tendo a Lua)



Meu problema de coluna e a consequente reclusão me fez enfrentar sublimações e descobrir prazeres indizíveis... Confesso que olhar minha "frota" de motocicletas, todas paradas, me corta o coração... Os cromados me convidam a passear, mas as vertébras me impédem... até de caminhar...

Mas para toda desventura existe uma contrapartida, um pagamento do destino, e este me presenteou com a minha mais nova paixão que é a astronomia ( mas que petulância a minha: chamar ver estrelas por um telescópio de astronomia...). Tenho, assumidamente, um perfil "obscessivo-compulsivo" e convivo bem com isso, tentando canalizar para algum proveito. Sendo assim, comprei alguns livros técnicos que foram devorados em dias, me transformando em neófito dos segredos celestes, um "aprendiz de feiticeiro" do Rogério Mourão - o pop star brasileiro da astronomia... A bem da verdade essa paixão teria me mordido quando numa madrugada estrelada, no interior do estado do Rio, por cima da Serra das Araras, descobri no meu telefone o Google Sky Viewer... Uau!!! estrelas brilhavam ao meu alcance... e no céu, outras tantas...

O céu de Ícaro é o céu dos mitos e do trágico...
Ícaro é filho de Dédalo, que, entre outras coisas, como o labirinto do Minotauro, fez asas de penas e cera para voar. Ícaro as foi testar. Desdenhou da recomendação paterna em sua ânsia juvenil de explorar o desconhecido e se aproximou do Sol. Um apaixonado... e como todo sentimento ardente e inconsequente, também é irresponsável... O calor derreteu a cera, e, ao final de sua provocação desmedida, ele se espatifou no mar, morrendo.

O final trágico de Ícaro, jogando-se ao Sol é poesia pura.

O céu de Galileu é aquele no qual o cientista, com lupas, telescópios e satélites, observa o espetáculo das leis da física que regem o destino igualmente trágico do universo, cujo parto de si mesmo – conjuntamente com o nascimento do espaço e do tempo – se dá em uma explosão cujos rastros que estudamos pelo ruido do Big Bang (a chamada radiação cósmica de fundo).

Particularmente, como cristão, vejo mais poesia num Criador e sua criação que numa reação de núcleos atômicos...

O céu que Galileu descortinou não é o céu plácido dos namorados. É um céu catastrófico, violento, onde as leis da física são levadas a extremos... com destinos cruéis... As estrelas são palco de uma luta intensa entre a força de autogravitação, que tende a comprimi-las, eas reações nucleares em seu interior, que equilibram a gravitação.

Quando o combustível nuclear se esgota, algumas escurecem lentamente, e outrasexplodem em morte violenta. Dependendo da massa da estrela, a explosão que a aniquila deixa um cadáver distinto, que necropsiamos com nossos satélites... As mais massivas terminam como buracos negros ou estrelas de nêutrons – uma colher de chá da massa destas últimas pesaria mais do que um bilhão de toneladas. As menos massivas acabam como estrelas diminutas, anãs brancas.

O céu que vejo é o céu de minha memória, das serras... do meu Recife... O mesmo céu do recifense Manuel Bandeira (este sim, por amor, falava com estrelas )... O céu de Galileu, com seus fenômenos catastróficos, de tão desmesurado, dificilmente poderia ser sonhado por um poeta, ou mesmo por um "astrônomo plégico de varanda"...

Quero o céu de Ícaro... apaixonado pelo inatingível sol...

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sábado, 14 de janeiro de 2012

Sangue e Paixão

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Se há uma coisa que a vida nos ensina, é que há coisas que não adianta ensinar!
-A gente sempre erra!!!
São coisas que simplesmente acontecem, vão tomando conta, se instalam com vida própria e sem pedir licença, independem de nossa vontade!!!
Veja a paixão, por exemplo! O que leva uma pessoa a gostar de outra às vezes de forma doentia, absoluta, anemiante?
E como explicar a escolha por esta ou aquela pessoa?
Escolha?
O pior é que a gente não escolhe. De repente você acorda e ela está lá…no espelho, desafiando você e as suas razões! Pura discrasia...

As paixões costumam ser um dicionário do que não se deve fazer, um verdadeiro desastre! Como usar anti-coagulante para tratar a hemorragia!
Pra começo de conversa, gostamos de quem não nos quer... um complexo de antígeno e anticorpo... Temos propensão para nos apaixonar pela pessoa certa na hora errada, ou pela pessoa errada na hora certa! Às vezes as duas coisas ao mesmo tempo! Parece uma coisa meio masoquista, cíclica, um dejavu em circadiano...

A pior das paixões é presente nas relações desequilibradas...
Nada mais angustiante do que investir num relacionamento que não dá retorno, que exige que você fique alerta, que gera instabilidade constante. Você transforma-se em detetive de sua própria consciência, em fiscal de seus próprios sentimentos, em manipulador de contradições! Adquirimos o perverso dom de olhar as coisas pelo avesso como se o avesso fosse o direito, ou muito pelo contrário! Nessas horas, sem outro recurso capaz de restaurar a dignidade, recorremos à ironia e ao sarcasmo, atitude que, na maioria das vezes, destrói o que resta do sentimento. Entra-se numa via de mão única, sem respaldo lógico, mas paradoxalmente envolvente, viciada, suicida! Como uma cascata de coagulação... Uma busca no desconforto do prazer e do belo...

O complicador é que paixões não se medem em sistemas métricos, centesimais, mas em batimentos cardíacos e na temperatura do sangue!
Paixão verdadeira…uma doce agonia…um desafio à razão, uma esperança de vida…um veneno que, aos poucos e com cruel sutileza nos anestesia o discernimento!
Complica ainda mais quando o coração apaixonado domina, assume vida própria, uma neoplasia, seguindo pelo mundo, cego, subindo serras, desenfreado, deixando as consequências na conta da auto-estima!

Por que insistimos em ignorar os avisos que a vida dá?
Por que nos escondemos do bom senso e da razão e inventamos uma lógica insensata, uma maneira de sofrer com prazer, uma angústia ansiosamente esperada?
Freud explica?
Acho que nem ele... mas, pensando bem, que apaixonado quer explicações?

Às vezes parece que a paixão não passa de uma febre voraz, uma maluquice arrebatadora e inevitável, surgida na madrugada inesperada, cadela viralata... uma fatalidade quase maquiavélica e absolutamente irresistível! E essa é a melhor parte… a doença é ao mesmo tempo a cura! Quando percebemos a perda do respeito próprio, o desprezo dos princípios e da estima intelectual. Essa percepção, por si só, já é meio caminho andado para a cura!

Mas veja como são as coisas? Que farsa patética nosso coração encena em "produções independentes"!!!
Sem a menor cerimônia, ele corta o "d" no gerúndio, forjando sentimentos revirados, que nos consomem e nos viram do avesso, do avesso, do avesso...

Talvez a solução seja recuperar a capacidade de agir em defesa do que achamos certo, acabando com a angústia de estar tão perto da paixão mas tão longe de nós mesmos!!!

-Ou não...


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quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

Sobre o Morrer - Ao Amigo Sodré

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Como médico, por mais experiente que me considere, nunca vou compreender o significado da morte por doença... da morte sofrida... dolorosa...
Hoje estou perdendo uma paciente/amigo...
Após alguns anos lutando contra um Mieloma Múltiplo... houve agravamento da doença... Morava em outra cidade... por vezes o visitei... Complicações... e eu, atualmente um "aleijão"... impossibilitado de acompanha-lo... Culpa... 


Há dores que fazem sentido, como as dores do parto: Uma vida nova está nascendo. 
Há dores que fazem sentido nenhum... 
Morrer sofrendo dor inútil. Qual será o ganho humano? Que eu saiba, apenas a consciência apaziguada de nós médicos, que dormimos em paz por haver feito aquilo que o costume manda...  costume a que frequentemente damos o nome de ética.


Já tive medo de perder pacientes... Hoje não tenho mais. O que sinto é uma enorme tristeza...


Bom seria se, depois de anunciada, ela acontecesse de forma mansa e sem dores, longe dos hospitais, em meio às pessoas que se ama, em meio a visões de beleza.


É dever de nós médicos fazermos todo o possível para que a vida continue... Sou fervoroso nesse princípio... Luto pela vida... mas... pela Vida.


Aprendi com Albert Schweitzer que a "reverência pela vida é o supremo princípio ético do amor". 


Mas o que é vida? 
Quem a define? 
O coração que continua a bater num corpo abstrato? 
Fluxos de sangue em artérias cerebrais?
Ondas elétricas num monitor?


A despeito de toda Biofísica e Bioquímica estudada, confesso que nunca me encontrei com a vida sob a forma de batidas de coração ou ondas cerebrais. A vida humana não se define exclusivamente sob prisma biologico. 


Comovi-me com o drama do jovem francês Vincent Humbert, 22 anos, cego, surdo, mudo, tetraplégico, vítima de um acidente automobilístico. Comunicava-se por meio do único dedo que podia movimentar. E foi assim que escreveu um livro em que dizia: "Morri em 24 de setembro de 2000. Desde aquele dia, eu não vivo. Fazem-me viver. Para quem, para que, eu não sei...". 


Permanecemos humanos enquanto existe em nós a esperança da beleza e da alegria. 
Morta a possibilidade de sentir alegria ou gozar a beleza, o corpo se transforma em forma inerte de desesperança...


Morre lentamente quem se transforma em escravo do hábito, repetindo todos os dias os mesmos trajetos, quem não muda de marca, não se arrisca a vestir uma nova cor ou não conversa com quem não conhece.
Morre lentamente quem faz da televisão o seu guru.
Morre lentamente quem evita uma paixão, quem prefere o negro sobre o branco e os pontos sobre os “is” em detrimento de um redemoinho de emoções, justamente as que resgatam o brilho dos olhos, sorrisos dos bocejos, corações aos tropeços e sentimentos.
Morre lentamente quem não vira a mesa quando está infeliz com o seu trabalho, quem não arrisca o certo pelo incerto para ir atrás de um sonho, quem não se permite pelo menos uma vez na vida, fugir dos conselhos sensatos.
Morre lentamente quem não viaja, quem não lê, quem não ouve música, quem não encontra graça em si mesmo.
Morre lentamente quem destrói o seu amor-próprio, quem não se deixa ajudar.Morre lentamente, quem passa os dias queixando-se da sua má sorte ou da chuva incessante.
Morre lentamente, quem abandona um projeto antes de iniciá-lo, não pergunta sobre um assunto que desconhece ou não responde quando lhe indagam sobre algo que sabe.
Evitemos a morte em doses suaves, recordando sempre que estar vivo exige um feito muito maior que o simples fato de respirar. Somente a ardente paciência fará com que conquistemos uma esplêndida felicidade. ( Pablo Neruda)


Que o Eterno guie a arte de curar juntamente com o respeito pela vida!
... e que eu tenha respeitado meu amigo...


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quarta-feira, 11 de janeiro de 2012

La Vie En Rouge

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As mães nos fazem sangrando
E nos prendem a vida toda
Por uma tira de carne viva
Somos educados em gaiolas
Vivemos mastigando pedaços
De seios arrancados sangrando
Que penduramos na borda dos berços
Temos sangue no corpo todo
E como não gostamos de vê-lo
Fazemos correr o dos outros
Um dia, não haverá mais
Seremos livres.


(Boris Vian)


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segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

Por Quem Os Sinos Sangram

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“A morte de qualquer homem me diminui, porque eu sou parte da humanidade; e por isso, nunca procuro saber por quem os sinos dobram, eles dobram por mim”.

Conheço desde muito cedo os livros de Hemingway... herança de minha fome por livros... também sedento de curiosidade, encontrei John Donne, poeta inglês, de quem, na verdade, Hemingway "usurpou" destacando em seu livro: Por Quem os Sinos Dobram.

Lembro que sinos quase não tocam nas capitais... mas continuam sangrando minhas memórias...

Sons da minha infância... no meu Recife... Igreja vizinha no Derbi... Cúpulas e badalos que soavam lembrando, como ao poeta de Itabira, que um sino sangra a saudade de qualquer coisa, sabida porem esquecida...

Surgem os versos de Murilo Araujo, que gotejam de minhas veias... dando a minha lembrança o "Soneto Ao Último Sino"...


...Que riso matinal nos sinos claros,
dos domingos de outrora em que me vinhas,
e eu via Deus pelos teus olhos caros,
erguendo aos céus as tuas mãos nas minhas!

No altar, de mármore de Paros,
gorjeavam de amor as andorinhas
contrapontando os seus acordes raros,
com os tintinábulos das campainhas.

Onde a festa divina dessas horas?
O riso matinal dos sinos claros
já longe, no passado, emudeceu.

E só meu coração dobra a desoras,
dobra, em meio ao maior dos desamparos,
pela felicidade que morreu...



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sábado, 7 de janeiro de 2012

Sangue em Nome de Deus

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As 3 grandes religiões monoteístas - cristianismo, judaísmo e islamismo - pregam a paz, a tolerância, a compaixão e o amor ao próximo...

Entretanto essas religiões deixaram suas marcas em guerras e banhos de sangue ao longo da história. Uma explicação estaria na própria lógica do monoteísmo: se apenas o "meu" Deus é verdadeiro, os "outros" certamente são falsos - e seus seguidores, infiéis. "As religiões são diferentes, mas todas elas exigem a mesma exclusividade"

Foi assim com os judeus, os primeiros monoteístas, que reivindicaram uma aliança especial com Deus há 4 mil anos. Sua noção de "povo eleito" foi atacada por patriarcas da igreja, que no século IV qualificaram os seguidores do judaísmo de filhos do Diabo e inimigos da raça humana. O 1º Concílio Católico culpou-os pela morte de Jesus - uma acusação só retirada em 1965, no Concílio Vaticano 2º, e que insuflou 2000 anos de injúrias e matanças. Durante a Inquisição, por exemplo, milhares de judeus foram parar na fogueira; outros tantos se converteram em massa à fé cristã, já que o batismo era a única chance de salvação.

No século VII, foi a vez de o islã tentar impor a primazia de seu Deus sobre os demais. Os exércitos de Maomé partiram da Arábia para invadir o Oriente Médio, o norte da África e a Espanha. "O objetivo da expansão não era tanto econômico ou político, como no imperialismo ocidental do século XIX, mas a conquista em nome da fé, que eles acreditavam ser a verdadeira".
Reconhecidos como "povos do livro", judeus e cristãos puderam manter sua fé desde que pagassem altos tributos - e, dependendo do governo em exercício, sofriam perseguições.

Assim, quando o papa Urbano 2º lançou as cruzadas para tentar recuperar a Terra Santa, os espanhóis já vinham lutando contra os muçulmanos havia quase 400 anos. Urbano prometeu apagar para sempre os pecados de quem embarcasse na empreitada, que fracassou depois de transformar Jerusalém em um cemitério a céu aberto. "Cabeças, mãos e pés se amontoavam nas ruas", segundo relatos...

No século XI o 4º Concílio de Latrão proibiu os judeus de exercer funções públicas e os obrigou a usar um distintivo de identificação sobre as roupas - medidas que seriam reeditadas no século XX por Hitler e o regime nazista. É certo que o Holocausto foi executado no auge da sociedade moderna e racional. Mas a força motriz do genocídio - o antissemitismo - se nutriu dos mitos religiosos arraigados durante séculos na Europa.

Da mesma forma, só é possível entender os conflitos dos anos 90 nos Bálcãs tendo em conta as heranças religiosas do passado. No século XIV, a região foi invadida pelos turcos-otomanos - o último império muçulmano, que determinava a identidade das pessoas pela religião a que pertenciam. A maioria delas pôde continuar acreditando no Deus do cristianismo, sem os mesmos direitos dos "fiéis". Muitos, no entanto, se converteram ao islamismo - e veio o problema. "Os atuais bósnios muçulmanos descendem daqueles que se converteram durante a conquista turca". "Para os sérvios, eles são traidores."

Cristãos ortodoxos, os sérvios até hoje celebram o ano de 1389 - quando Lazar, chefe das tropas sérvias, morreu enfrentando os muçulmanos e virou mártir. O líder sérvio Slobodan Milosevic invocou esse sacrifício em seus discursos de 1989, acendendo a chama dos confrontos que levariam a uma matança desenfreada.

A linguagem religiosa tem o poder de "trasladar o conflito humano a uma dimensão cósmica". Traduzindo: no dia-a-dia, não matamos gente; mas, se Deus ordena, podemos. Nesse caso, a violência não seria um ato selvagem, mas o cumprimento da vontade divina.

Já o século XX viu crescer uma devoção militante nas principais religiões, chamada popularmente de fundamentalismo. "Alguns fundamentalistas não hesitam em fuzilar devotos numa mesquita ou matar médicos que fazem aborto. A maioria não é violenta, mas rejeita conquistas da modernidade, como a democracia, o pluralismo, a tolerância religiosa e a separação entre religião e Estado", diz Karen Armstrong, autora do livro Em Nome de Deus ( que cito e comento com
"aspas" várias vezes )

Para esses radicais, nossa sociedade racional e pecadora tem levado a uma crise moral. "O fracasso da modernidade seria causado pela ausência de Deus". Essa reação ocorre não apenas nas religiões monoteístas mas também no hinduísmo e no budismo.

Apesar das enormes diferenças entre os grupos fundamentalistas, eles geralmente buscam reconduzir sua religião ao caminho "puro e verdadeiro" de seus ancestrais. Por isso, os alvos principais são os seguidores moderados de sua própria crença. Foi o caso dos protestantes americanos que, no início do século XX, quiseram se distinguir dos protestantes liberais e se denominaram "fundamentalistas" - daí o nome. Eles queriam voltar aos fundamentos da tradição cristã, o que incluía interpretar a Bíblia da forma mais literal possível e parar de ensinar a Teoria da Evolução nas escolas - uma campanha que ainda divide os EUA.

Dentro do judaísmo foi criado o grupo ultraortodoxo Naturei Karta, que é contra a existência do moderno Estado de Israel. Para esse grupo, o regime israelense é herético porque sua ideologia fundadora - o sionismo - rejeitaria Deus e a Torá - o livro sagrado. Rabinos do Naturei Karta apoiam o presidente iraniano Mahmoud Ahmadinejad, que prega a destruição de Israel.

Já o fundamentalismo islâmico vem do grupo Irmandade Muçulmana, fundado no Egito. Para ele, o islã entrou em decadência ao adotar o modo de vida ocidental. Portanto, é preciso derrubar os governos moderados e substituí-los por regimes baseados na lei islâmica. São essas ideias que inspiram terroristas como os da Al Qaeda.

Mas o radical islâmico que joga um avião contra um prédio não acredita no mesmo Deus que um muçulmano moderado? Como o Deus de um pode condenar esse crime, se o Deus do outro promete transformá-lo em herói? Aí é que está: o Deus é o mesmo, mas as interpretações de sua mensagem são distintas. O suicídio, por exemplo, sempre foi pecado na tradição islâmica. Hoje, no entanto, é interpretado como martírio pelos fundamentalistas - e usado como arma por terroristas.

Curioso que nossa sociedade brasileira, ocidental, cartesiana e cristã, fundamentada em valores oriundos do derramamento sacrificial de sangue pelo nosso Messias, não tenha amadurecido o respeito e a capacidade de compreensão da fé alheia.

Sou Presbiteriano por convicção e por fé e não defendo o ecumenismo, tendo minhas convicções na reforma calvinista bem arraigadas, mas também tenho certeza que o respeito religioso e a convivência pacífica inter-doutrinária é e sempre será um dos principais pilares de sustentação da paz e da evolução da sociedade.

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Dica de Leitura:
"Em Nome de Deus"
Karen Armstrong, Cia das Letras.
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sexta-feira, 6 de janeiro de 2012

Sangue Azul


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Depois que os mouros dominaram a Península Ibérica, no século VIII, os espanhóis – originalmente de pele bem branca – passaram a ter filhos mais morenos, como a maioria de sua população atual, devido à miscigenação com os invasores. A aristocracia, no entanto, orgulhava-se de não ter se misturado àquele povo de pele quase negra e apontava para as próprias veias, onde parecia correr sangue azul, como se isso fosse prova de uma ascendência mais nobre. De fato, o sangue venoso tem aspecto azulado se visto através da superfície da pele, ainda mais se esta for clara, acentuando o contraste de cores. Daí em diante, a expressão "sangre azul" percorreu o planeta como sinônimo de nobreza.

(Bíblia da etimologia mundial)

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quinta-feira, 5 de janeiro de 2012

Sobre Doação e Doadores de Sangue

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A qualidade do sangue ( hemoderivados e hemocomponentes ) melhorou acentuadamente no Brasil. Há hemocentros operando com indiscutível padrão de excelência, entretanto, questionamentos primais seguem em reticências...

-Que modelo poderá garantir à população brasileira menor perda ou desperdício de sangue e maior segurança a doadores e receptores, não apenas a grupos restritos da maior importância, como os hemofílicos, mas a pacientes hospitalares em geral? 
-De que modo o ensino médico e a residência poderão garantir o aprofundamento e permanente atualização dos conhecimentos clínicos sobre a hematologia e a hemoterapia? 
-Como garantir o suprimento de hemoderivados no país?


Basta uma rápida leitura dos noticiários ou uma ida aos hemocentros (onde a demanda por "hemoprodutos" é sempre muito superior a oferta) para perceber a gravidade do problema.

A complexidade do ato da doação, por um lado, e os fortes vínculos de sangue na sociedade brasileira, por outro, compõem o binômio que talvez permita entender as razões da falta crônica de sangue em nosso país.

A Organização Mundial de Saúde (OMS) recomenda que 2% da população sejam doadores.  Existem dados que apontam um percentual de apenas 0,7% para o Brasil (por outro lado, 6% da população inglesa são doadores regulares). Pior ainda, doação no Brasil é também uma questão de classe: em São Paulo, 65% dos doadores provêm das classes baixas (C e D, na classificação do Instituto Gallup). 
Um ponto que merece destaque é o número proporcionalmente elevado de doações 'vinculadas', isto é, de pessoas que estão repondo o sangue recebido por algum parente ou amigo. Na hemorrede, as doações de reposição representam até 80% do total. Este dado é preocupante, pois 20% a 25% delas não passam nos testes e têm de ser descartadas. Ao passo que, entre doadores espontâneos, apenas 8% a 10% têm o sangue rejeitado. 
O Brasil necessita, portanto, de mais doadores e, particularmente, de doadores voluntários de todas as classes sociais...


-Será que nós brasileiros somos pouco altruístas? 
-Esta característica estaria dissociada de nossa cultura nacional? 


Nos Estados Unidos, onde os blood drives dos últimos trinta anos elevaram de muito a proporção de doadores regulares, onde é fácil estabelecer nexo entre o caráter nacional e a 'generosidade' da população norte-americana. Um indicador é a conhecida filantropia em larga escala, praticada por instituições, milionários e cidadãos de alguma posse nos EUA. 


-Ora, seriam os brasileiros menos filantropos? 


Não conheço estudos quantitativos sobre a filantropia no Brasil, mas não creio que sejamos 'menos' filantrópicos que outros países, apesar do desestímulo fiscal. (Nos Estados Unidos, como se sabe, cada níquel doado tem sua contrapartida de dedução fiscal para o taxpayer.) 

Há várias hipóteses para explicar a falta de bons doadores e de doadores em bom número no Brasil. Se desconsiderarmos a possibilidade de uma cultura 'não-filantrópica', há algumas explicações alternativas. Uma delas foi defendida pelo professor Danton Chamone: "Ao contrário da Europa, o Brasil nunca passou por guerras e grandes catástrofes. Na Europa, a cultura de guerra provavelmente ampliou a tradição de doar sangue voluntariamente. O papel do sangue como salvador de vidas parece ainda pouco claro na cabeça do brasileiro." A hipótese é atraente, mas paralisante pois já que não tivemos guerras devastadoras, só nos restará conviver com a falta crônica de doadores?

O clássico de Richard Titmuss, The gift relationship: from human blood to social policy, revela toda a gama de sentimentos que acompanham o ato de doação: a compaixão, a obrigação moral, o altruísmo, a necessidade de aprovação social, a expectativa de reciprocidade etc...


-Como se sentirá o doador brasileiro? 


Desde logo, assinale-se que nós médicos pouco entendemos da psicologia do ato transfusional e da doação, em particular. As unidades de coleta têm nos enfermeiros e assistentes sociais seus atores mais importantes e com mais sensibilidade no trato com o doador. 


Ao se tratar de uma doação tipicamente altruísta (na qual desconhece quem receberá seu sangue), creio que o doador terá sentimentos confusos e contraditórios, pois os brasileiros, particularmente das elites, associam sangue a laços de sangue, a laços familiares. 
Doação, para as classes média e alta, em particular, é uma questão de família, "sangue não é bem de troca, o sangue é como se fosse jóia de família".

Em Raízes do Brasil, o maravilhoso Sérgio Buarque de Holanda (que citei em minha ultimo "post" deste blog) nos deu a chave para entender o difícil trato dos brasileiros para com a esfera pública, sua tendência a reduzir as exigências da sociabilidade e da solidariedade social a uma mera questão de família. Os vínculos de afinidade criam-se menos em decorrência do convívio social no terreno da 'civilidade' do que do convívio e dos interesses de 'sangue', de natureza familiar. A sociedade patriarcal, nossa formação histórica centrada no poder da grande família proprietária de terras e escravos, criaram esta espécie de filtro da sociabilidade: toda ação social que não passar pelo estreito crivo dos interesses de sangue será descartada. O homem "cordial" brasileiro, é justamente o tipo que pauta sua conduta social pela esfera do íntimo familiar e do privado.

Ora, a doação de sangue genuína, —que é a doação altruísta não vinculada, exige um tipo de sociabilidade aberta, livre das amarras dos laços primários. Isto pode significar que a vida social de um país em que predominem os laços da afetividade ( familiares ) sobre os da civilidade poderá conviver com diversas formas de altruísmo, mas a doação de sangue será uma das formas menos difundidas de comportamento altruísta. Isto vale particularmente para os abastados, dos quais se poderá dizer que preferem perder os anéis para não perder o precioso sangue.

Portanto, como médico hematologista e militante na tragédia diária da "falta de sangue", imagino que o foco é (também) promover campanhas e ensinamentos nas escolas, em todos os níveis, que ressaltem o valor da doação como ato generosa e genuinamente social...


Sonho morar num Brasil onde seja parte do cotidiano de todos a doação regular de sangue...


Que tenhamos fibra e sangue para isso!!!


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Laços de Sangue


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"Um dos efeitos decisivos da supremacia incontestável, absorvente, do núcleo familiar — laços de sangue e do coração — está em que as relações que se criam na vida doméstica sempre forneceram o modelo obrigatório de qualquer composição social entre nós."
Sérgio Buarque de Holanda


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quarta-feira, 4 de janeiro de 2012

O Sangue, Religião, Ciência e Vida

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[...] “pois a alma de todo tipo de carne é seu sangue pela alma nele. Por conseguinte, eu disse aos filhosde Israel:
- Não deveis comer o sangue de qualquertipo de carne, porque a alma de todo tipo de carne é seu sangue. Quem o comer será decepado [da vida].

Quanto a qualquer alma que comer um corpo morto ou algo dilacerado por uma fera, quer seja natural quer residente forasteiro, neste caso terá de lavar suas vestes e banhar-se em água, e ele terá de ser impuro até à noitinha; e ele terá de ser limpo.
Mas, se não as lavar e se não banhar sua carne, então terá de responder pelo seu erro” [...].

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A religião organiza e separa o espaço da vida comum do espaço sagrado e lhes dá qualidades culturais, contribui para o sistema de conhecimento dos homens e para a construção dos símbolos/ritos e seus significados.

...“as religiõesunem as pessoas em práticas e crenças comuns;aproximam-nas em um mesmo objetivo de vida, eser religioso significa tantas coisas para pessoastão diferentes, que freqüentemente unscontradizem os outros”.

Durante a minha prática profissional e em contato com algumas pessoas idosas, tenho tentado traduzir o significado do sangue e das transfusões sangüíneas.

#Para os idosos, é freqüente a expressão que o sangue significa vida e que sem sangue não há vida.
Recebendo sangue ficam mais fortes! Para as pessoas idosas, o sangue representa a vida, o que confere com o que se encontra nas literaturas pertinentes, as quais colocam que o sangue representa, como ícone, o símbolo da vida,o “fluxo vital”.

A perda do sangue tem mais significância que a perda da consciência, da respiração, dos movimentos e, por que não dizer,da vida. Apenas nos vivos este sangue flui; nos mortos, este sangue coagula, para, morre...

O sangue está sempre presente na vida social. A ele se reconheceu, muitas vezes, um misterioso poder de catalisador social: Os Bororos (indígenas quese denominam boe que, em sua língua quer dizergente, pessoa humana), são habitantes de várias aldeias em áreas descontínuas do vale do rio São Lourenço,no Mato Grosso, que se consideravam poluídos ( ou mesmo sujos ) em alto grau quando tinham um mínimo contato com o sangue,enquanto os Nambiquaras (indígenas habitantesde aldeias espalhadas em áreas descontínuas, entre os campos cerrados da Chapada dos Parecise as matas do vale do rio Guaporé, no MatoGrosso, e em Rondônia), consomem suas caças meio cruas e sanguinolentas.

Durante toda a história do homem, o sangue possui algum significado, na áreareligiosa:
Na era pagã, os nossos antepassados utilizavam sangue como sacrifício, provocando o derramamento para seus deuses.
Até mesmo hoje,o sangue ainda tem essa importância. Basta nosreferirmos à Igreja Cristã, onde na Eucaristiatemos como representação o corpo e o sangue de Cristo. ( Lembrando a todos que sou critão praticante e Presbiteriano por convição e Graça... )
Os gregos reconheciam o sangue como sustentáculo da vida. Os gladiadores romanos ingeriam sangue para ficarem mais fortes e corajosos.
O sangue, às vezes, é considerado impuro,e às vezes participa de ritos de purificação.
Em algumas ocasiõeslhe é atribuído valor regenerador e alguns o vêem como princípio vital; noutras oportunidades, é tido como portador de destruição e de desgraça.


Segundo Geertz:
,“O Homem é um animal amarrado às teias de significados que ele mesmo teceu”.


Assim, os significados atribuídos ao sangue refletem diretamente na transfusão sanguínea... e em todo o imaginário que ela apresenta, mesmo nos mais culturizados...

Quanta responsabilidade para nós médicos... que transfundimos, sangramos e vertemos sangue...

-Merecemos tanta honra???


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segunda-feira, 2 de janeiro de 2012

Lágrimas da Amor e Sangue

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As lágrimas são o sangue da alma. -Santo Agostinho.

Assuero
(com hematidrose)


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domingo, 1 de janeiro de 2012

Meu Alterego

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Alter ego (do latim alter = outro egus = eu) pode ser entendido literalmente como outro eu, outra personalidade de uma mesma pessoa. Indica uma identidade secreta de alguem ou um personagem que é a expressão de nossa personalidade não declarada.
Para a psicanálise, o alter ego é um outro eu inconsciente.


Batman é o alter ego de Bruce Wayne.

Homem-Aranha é o alter ego de Peter Parker.

O Hulk é o alter ego de Bruce Banner.

Mr. Hyde é o alter ego do Dr. Jekyll no conto O Médico e o Monstro.

Clark Kent é o alter ego do Superman.


Bem... Como Hematologista, nada melhor que um Homem-Vampiro *
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